Hoje apetece-me partir tudo, pegar na minha mota e desaparecer ao longe, deixar de vez a faculdade e os amigos, dizer adeus aos pais e ir embora.
Nunca pensei que surgisse uma coisa destas. Olho para a minha cara no espelho da casa de banho e não quero acreditar no que aconteceu. Acho que ando com mau aspecto, talvez seja porque estou sem pachorra para fazer a barba. A minha mãe diz que tenho de a fazer todos os dias, porque ainda não é suficientemente forte para se deixar crescer e se não me barbeio fico com ar doente. Eu sei que é por outra razão, mas não consigo falar com os meus pais sobre o que se passou: uma negativa a Neuro-Anatomia.
Tentei ter uma conversa com o Pedro. Disse-lhe que não tinha nenhuma namorada, não andava com ninguém e que tinha tido um problema. Mas que problema foi esse? Ainda hoje me pergunto: como é que eu reprovei a neuro anatomia? Uma disciplina em que não tinha dificuldades? Sempre gostei de saber o que é que há no cérebro, porque é que temos problemas na cabeça, qual é a zona do cérebro que “trabalha” o tema MULHEIRES. Numa semana fui operado ao joelho, fiz uma artroscopia exploratória, falei sobre a minha paixão de medicina com o médico, disse que tinha concorrido à UP para medicina. Andei nervoso e passados alguns dias soube que tinha entrado em Medicina. A minha mãe era economista e o meu pai engenheiro, não saí a ninguém de lá de casa. A minha irmã é arquitecta de interiores e mora em Barcelona desde 1993. Já lá vão sete anos, costumamos estar juntos no Natal, no Ano Novo e na Páscoa mas já não é a mesma coisa. Às vezes vou lá fazer uma visitinha, passo lá dez dias. Sinto saudade das nossas conversas, das nossas noitadas a ver filmes e a comer pipocas. Sinto saudades das nossas corridas de mota. Nunca lhe disse isto mas ela andava melhor do que eu.
Peguei na mota e fui até à Foz para tomar uma cerveja ou duas, telefonei ao Eduardo mas ele estava na faculdade a fazer um trabalho com um amigo. Telefonei pela cagajésima vez à Rita mas ela estava em casa de uma amiga, porque a mãe dessa amiga tinha morrido. Detesto ir para o café sozinho, não gosto mesmo nada. Parece que não pertenço a este mundo. Pedi ao Sr. Arsénio um café forte, curto e em chávena escaldada. Decidi então telefonar à Joana mas ela não me atendeu o telefone. Acho que anda chateada comigo desde 1994. Já lá vão seis (6) anos, que chatice. Ela era uma amiga muito especial, muito especial mesmo. Gostei dela desde o dia em que a conheci, ou seja, na recepção ao caloiro na faculdade. A Joana era uma rapariga lindíssima, muito bonita mesmo e ela um dia chegou muito envergonhada à minha beira e perguntou-me:
- Sr. Dr, quer ser o meu padrinho?
Nem sabia o que dizer na altura, pedi-lhe para ela me dar 1 dia para pensar, porque já tinha outras raparigas que também me tinham pedido.
Lá estudei até às 18:00 e fui até casa da minha avó, tinha combinado ir com ela ao cemitério. Mas acabámos por não ir, ela estava extremamente cansada, disse-me que já não está com idade para ir ao cemitério todos os dias. Como esta semana já tinha ido duas vezes tinha decidido à última da hora não ir.
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