sexta-feira, 9 de novembro de 2007

Capítulo 7: "Está na hora"

Telefonei ao Eduardo mal cheguei a casa depois do jantar com a Mariana. Ela ainda tinha de ir fazer a mala. Disse-me que vinha dentro de três meses para passar o aniversário do pai. Telefonei ao Eduardo porque estava numa “down”. Sabia que não ia poder beijar a Mariana durante três meses, que não ia poder estar com ela, que não ia poder tomar o cafezinho depois do pequeno – almoço na Foz. Mas adiante: combinámos uma partida de ténis no CTP para descontrair. E pronto, lá fomos jogar, perdi por 6-3 e 7-5. Combinámos também ir jantar a Espinho para pormos a conversa em dia, o Eduardo ultimamente andava muito por Aveiro por causa de exames, testes, e claro, Miúdas. Falei-lhe sobre a carta que a Mariana tinha recebido de Londres, mas ele disse-me o que me disse a minha mãe: que não podia agarrá-la para sempre, tinha que a “deixar voar”. Chorei a noite toda. Jantámos uma francesinha e bebemos duas cervejas cada um, não levei o Porsche, ainda estava chateado. Tão chateado que decidi levar a mota, e eu que normalmente não levava a mota à noite. Falei-lhe sobre a viagem da Mariana e ele tentou-me animar mas foi completamente impossível. Não consegui ir ao aeroporto, mas também a Mariana não me deixou, disse que já era difícil ver-me ficar “do lado de cá”. Disse que me ligava quando chegasse a Londres ao apartamento, como levava computador íamos falar todos os dias através do Messenger, mas falei ao Eduardo sobre uma viagem a Londres dentro de um mês e meio para lhe fazer uma surpresa. Quando lhe estava a contar isto ela ligou-me:

- Olá meu amor, então o que estás a fazer?

- Oh minha pequenina, a viagem foi boa? Eu estou a jantar em Espinho com o Eduardo!

- Eu acabei de jantar com o meu chefe, o responsável pela investigação, ele fala português muito bem, de maneira que não vai ser difícil comunicar com ele. O resto do pessoal é ingleses, americanos e um espanhol. Como sabes não me dou bem com os espanhóis e com este ainda menos. Foi muito antipático comigo, por eu ser portuguesa.

- Olha, antes que me esqueça: o meu pai vai-me dar um cão! Já viste a minha sorte? Consegui convencê-lo a ter um cão. Ainda não sei qual vai ser a raça, ainda tenho que falar com um amigo meu que é veterinário.

- Estás a ver? O teu pai é teu amigo! E o que é que fizeste hoje?

- Nada de especial, de manhã fui jogar ténis com o Eduardo, dei um passeio pela Foz, o que costumamos fazer juntamente com o Simba, almocei em casa e agora estou em Espinho a jantar. Está uma noite porreira, se calhar ainda vamos ficar por aqui para tomar um cafezinho. Ah, é verdade: amanhã, como é sexta vou treinar porque no sábado e domingo tenho um torneio de golfe muito importante. Quem sabe se jogar bem não volte a jogar pela selecção. Lembras-te das fotos e taças que te mostrei? Adorava jogar outra vez pelo nosso País.

- Só tens que treinar. Aproveita agora que estou fora, porque depois quando chegar tens que trocar os ferros por mim, ou se calhar, ainda começo a jogar contigo.

- Ok! Hoje quando chegar a casa vou ao Messenger, quando chegar mando-te um toque e depois falamos. Um grande beijo, amo-te!

- Eu também te amo!

Cheguei ao Messenger faltavam poucos minutos para a 1 da manhã, já lá estava a Mariana, com a nossa foto, uma foto que tirámos quando fizemos um passeio de barco no Douro, esse dia foi fantástico, passámos o dia todo no rio e viemos de comboio para o Porto, aliás foi nesse dia que vi o Porto a ganhar ao Benfica por 3-1. Contei à Mariana que tinha chorado desde casa dela até casa, mas ela também não estava melhor, também tinha chorado a viagem toda entre Porto e Londres. Enquanto esteve com os pais disfarçou mas quando entrou no avião desatou a chorar. Primeiro porque ia ficar separada de mim, dos pais e do irmão, depois porque teve de suportar aquelas despedidas cheias de emoção no aeroporto. Disse-me que tinha pensado em desistir da investigação e continuar aqui no Porto comigo, mas eu incentivei-a para ela continuar, apesar de estar numa “down”. Mas também três meses passavam depressa. Não lhe falei sobre a minha possível viagem a Londres mas isso também era surpresa. Aliás, já tenho algum dinheiro de parte para poder ir até Londres. Essa noite, chorei novamente, ainda por cima pus-me a ver um filme lamechas, um filme romântico, com a Julia Roberts e o Hugh Grant. Devia era ter visto de guerra, de acção para ver se me esquecia de que não ia ver a Mariana por alguns tempos.

O Eduardo realmente é um grande amigo, ligou-me nessa manhã, convidou-me para ir almoçar com ele à Foz mas eu preferi que ele viesse ter comigo ao clube, comecei a treinar ainda não eram 8:30. O meu treinador esteve a falar comigo, tivemos a filmar o meu swing para ver como estava, deu-me umas dicas para eu melhorar o meu jogo e depois fiquei por minha conta. O meu treinador é um ex-militar, de maneira que o treino era muito, muito intensivo, principalmente nas semanas anteriores aos grandes torneios. Como tinha dito à Mariana, ia jogar no fim-de-semana o tal torneio, era o torneio que fechava a temporada. E pronto, almoçámos e o Eduardo teve-me a ver treinar. Acabámos por passar a tarde juntos. Realmente, o Eduardo é um grande amigo, mas tinha combinado chegar cedo a casa porque ia jantar fora com os meus pais. Durante meses, aliás anos, discuti com o meu pai por causa do tema “Cão”. Era um tema tabu lá em casa, apesar de a minha mãe adorar cães. E pronto, lá fomos jantar a Matosinhos ao restaurante Sempr´assar, um restaurante que eu ia muitas vezes com a Mariana. O meu pai começou logo a dizer que não limpava a porcaria, que não ia com ele ao veterinário, que não lhe ia abrir a porta para sair à rua, blá, blá, blá...

Eu já sabia que o meu pai não ia tomar qualquer tipo de responsabilidade no que toca ao cão, ele simplesmente não gosta de cães. A minha mãe, pelo contrário estava entusiasmada porque desde sempre adorou cães, os meus avós maternos sempre tiveram cães de caça. Até tinha comprado uma data de revistas da especialidade e tinha falado com amigas que tinham cães. Falámos sobre todas as raças e chegámos à conclusão que devíamos ter um cão de companhia, não precisávamos de cães de guarda, a nossa casa tinha câmaras de vigilância. O meu pai veio logo com a conversa das aulas de obediência, de sociabilização. Concordámos em comprar um labrador, o cão da moda. Como no dia a seguir era dia de torneio decidi deixar este tema para mais tarde. Telefonei à Mariana pouco faltava para a meia-noite e fui dormir. Acordei com vontade de jogar golfe, bom golfe. Tinha sabido no dia anterior que ia jogar com a minha melhor amiga, a Martinha, era mais nova do que eu, tinha handicap 1,3 e já tinha realizado vários torneios fora de Portugal, já tinha representado a selecção nacional, o que era de registo. O pai era médico e a mãe era professora de matemática, e tinha de governar os milhões da família. A Martinha andava no 12º ano e queria ser médica, e foi aí que eu entrei, para além do pai.

Cheguei ao clube cedo, eram 8:15, acabei por tomar o pequeno-almoço no bar do clube. Tomei uma meia de leite bem quente, um croissant prensado e levei uma sande embrulhada para o caso de me dar fome. O driving range estava vazio, nenhum dos meus treinadores tinha começado a dar aulas. Aproveitei para pôr os meus auscultadores, ouvir um bocado de Rui Veloso, o meu artista preferido. Pouco tempo depois chegou uma amiga minha, a Maria, vinha com uma cara de sono, tinha saído com uma amiga no dia anterior. Foi aí que eu lhe disse:

- Oh Maria, então tu vais sair na noite anterior a um torneio importante? Não me parece muito prudente da tua parte. Eu deitei-me cedinho e estou aqui fresco como uma alface!

Ela como estava mal disposta disse:

- Ainda bem para ti!

Nem disse nada e continuei a treinar. Passado um bocadinho chegou a Inês, era filha de um professor de Química da Faculdade de Ciências do Porto. Veio ter comigo, deu-me um beijinho carinhoso e perguntou como é que eu estava. Sabia que eu estava numa “down” por causa da partida da Mariana para Inglaterra mas disfarcei e disse que estava melhor. O meu treinador apareceu depois para me desejar boa sorte e para eu jogar despreocupado. Se me lembrar que vou a jogar com uma das minhas melhores amigas mas também uma das melhores jogadoras de golfe de Portugal não vou dar na bola. A terceira pessoa da nossa formação não apareceu porque ficou doente à última da hora! Porreiro! Vou só eu e a Martinha, vamos aproveitar para conversar um bocadinho, divertirmo-nos. Falei-lhe do meu desaire a Neuro Anatomia, mas ela não deu muita importância. Deu-me força para continuar e não desistir ao primeiro problema. Como aquilo era um torneio de dois dias tinha que jogar concentrado nos dois e jogar bem, pensei cá para mim antes de enfrentar o primeiro buraco: “Se eu ficar hoje em primeiro e amanhã não der na bola, como é que vai ser?” Mas depois lembrei-me da conversa que tinha tido com o meu treinador, para jogar descontraído. Comecei tão descontraído que fiz par nos primeiros 3 buracos. Na saída do buraco quatro mandei uma semelhante estalada na bola só que ela apanhou um bocadinho de vento e foi para o rough da direita, fiquei com um shot complicado de ataque ao green, mas nessa altura a Martinha disse-me:

- Mário, quero essa bola na bandeira! Mostra o que vales!

Lembrei-me de ver o Tiger a dar um shot num rough no campeonato em Inglaterra e tentei fazer igual. Não ficou mal mas ainda estava a quatro metros da bandeira, e pensei cá para mim: “Bem, tenho dois putts para ganhar este par, não vou arriscar o birdie”. Vi bem a linha, esperei que a Martinha fizesse o putt e parti decidido. Lá dentro! Birdie! mas não entrei em euforias, parti para o 5 com mais vontade ainda de jogar.

- Grande saída! Disse-me a Martinha. Estou a ver que hoje estás em grande. Tu por acaso não andas apaixonado?! Dizem que faz bem no golfe, fica-se muito mais concentrado! Corei um bocadinho e falei-lhe da Mariana, ela ficou contente por mim. Nunca lhe disse, mas eu já gostei muito da Martinha, é uma miúda fantástica, mas fazemos uma diferença de 5 anos de idade, já é alguma coisa. Acho que o pai dela não ia gostar muito da ideia, ele continua a vê-la como uma menina, a SUA menina!

Continuei concentrado e a jogar bem, tão bem que fiz par do campo na primeira volta. Parámos durante uns minutos para descansar e recuperar forças e enfrentámos a segunda volta como se fosse a primeira, ou seja, tinha 0 pontos. Até disse à Martinha:

- Não me digas quantos pontos levo, porque assim fico nervoso! Sei mais ou menos mas prefiro não saber a verdade!

Bom, comecei a segunda volta com um bogey mas logo a seguir no par 5 fiz um birdie. Pensei para mim: “Mário, o que está para trás já não interessa. Interessa os próximos sete buracos. Se fizeres asneira, de nada valeu o esforço”. Bem, chegámos ao 12 e eu comecei logo a pensar nas últimas três vezes que lá tinha passado: furo, duplo, duplo!! Assim já me ia estragar a média, mas até que correu bem, fiz um bogey. Partimos para o 13 já com a club house ao longe... muito longe. Para quebrar o gelo, a Martinha deu-me um “toque”, de seu nome Mariana. Virei-me para ela e disse:

- Ora bem, começando pelo início: a Mariana é uma miúda que mora muito perto de mim, está neste momento a estudar em Inglaterra, a ajudar numa investigação. Tem a minha idade, o pai é economista e a mãe é rica!

- Desculpa!? Rica?

- Sim, só trata dos negócios da família, tem umas propriedades lá para cima, na região do Douro.

- E vocês já se conhecem há muito tempo?

- Há uns anitos, eu e ela temos em comum alguns amigos, acho que me lembro de a ver na festa de um amigo nosso, o Pedro.

- Como é que reagiram os teus pais?

- Reagiram com normalidade, eu já não sou novo, mas também não sou demasiado velho. E tu, como estás? Andas com alguém?

- Eu? Não tenho tempo para pensar nisso, como sabes o meu primeiro objectivo agora é regressar à Selecção Nacional e voltar a ser campeã nacional, coisa que já não acontece há dois anos.

- Por falar em selecção nacional, conta-me lá como é que o dia-a-dia num estágio?

- É muito duro, eu chorei no primeiro dia! O treinador não é muito simpático, critica-nos a maior parte das vezes e ainda por cima obriga-nos a fazer trabalho de ginásio... Eu que detesto estar num sítio a exercitar os músculos... Enfim, mas o sítio onde estávamos era privado, portanto não tive esse problema. Estive no quarto com uma grande amiga minha, que também já foi campeã nacional mas o seleccionador não nos põe a treinar juntos, porque já sabe que ia ser só conversa fiada e o treino ficava para segundo plano, por isso é que quando eu estou no driving range a treinar fico afastada do resto do pessoal. Não é por ser tímida mas porque quero e gosto de treinar sozinha. Ponho os auscultadores e ninguém dá pela minha presença.

- Sabes que eu gostava de ter motivação para treinar sozinho, mas ainda não a consegui arranjar!

- Oh Mário, tens de pensar que é para teu próprio bem, porque se não treinares não vais recuperar em alturas em que estejas mal. E sabes melhor do que ninguém que o golfe tem muitas alturas más.

- Sabes que desde que a Mariana foi para Inglaterra tenho treinado mais, mas mesmo assim não chega para manter o meu handicap. Já esteve em 0,2 mas nos últimos torneios tem vindo a subir, já não consigo descer há uns dois meses.

- Oh Mário, mas também não tens treinado tanto quanto isso. Eu por outro lado tenho vindo cá sempre que posso, felizmente a minha mãe consegue-me vir cá trazer, outras vezes venho de comboio, chego aqui, aqueço batendo umas bolas, depois parto para o campo e faço meia dúzia de buracos. Mas olha falando de outra coisa: como é que vai o teu serviço como voluntário?

- Olha, fazemos uma coisa: tu convidas-me para almoçar na sexta-feira, eu escolho o restaurante e falamos melhor. Agora, desculpa lá mas quero continuar a jogar bom golfe.

- Tens razão, Mário! Desculpa! Estás a ver porque é que eu quero treinar sozinha? Assim, não converso com ninguém. Bem, vamos mas é acabar os 18 buracos e vamos almoçar à club house.

- Ok, vamos a isso!

E pronto, lá fomos nós até ao 18, um belíssimo par 5 com um lago enorme à nossa frente. Vi para que lado estava o vento, calculei a distância, olhei para o saco, tirei o sand wedge e a bola…

PLOC!!!

- No buraco! Birdie para acabar!

E pronto, assinei o cartão, esperei que a Martinha fizesse o putt, dei-lhe dois beijinhos e agradeci a companhia.

- E desde já, fica combinado o almoço para sexta-feira!

- Conta comigo, amigo!

Entreguei o cartão à Carla, a chefe da secretaria e fui tomar um banho rápido. Almocei com a minha mãe e com o meu pai, porque afinal a Martinha ia almoçar fora com os pais. Falei-lhes da minha prestação do dia e eles ficaram contentes, como é óbvio. Quando acabei de almoçar liguei ao Eduardo para irmos tomar um cafezinho, ele já estava a contar comigo, de maneira que combinámos ir ao Arcada em Espinho. Tomei o meu café do costume: chávena a ferver, café forte e bem tirado, como dizia na brincadeira. Falámos muito sobre o golfe, as miúdas, o meu futuro cão e sobre motas. Ele disse-me que o pai lhe ia oferecer uma Moto 4 da marca XPTO, de não sei quantos cavalos. Eu disse-lhe:

- Eduardo, tem cuidado com isso! As moto 4 são mais perigosas que as motas normais, viram com muita facilidade, há tantos tipos a entrar pela Urgência com pernas partidas, destroçadas, até posso dizer.

- Oh Mário, é que nem penses em contar isso ao meu pai, ele assim não me dá a mota. E o tempo que eu demorei a convencê-los, não me lixes, pá!

- Oh Eduardo, está descansado que eu não vou falar sobre isto ao teu pai, mas como teu grande amigo só te estou a avisar...

- Olha, e o que achas que vai acontecer amanhã?

- Eh, pá! Nem me digas nada: não sei como é que vai ser amanhã, acho que ainda vou treinar um bocado lá no jardim de minha casa. Olha, antes que me esqueça: convidei a Martinha a almoçar comigo na sexta-feira, vou buscá-la ao colégio e vamos almoçar. Estava a pensar no D´Oliva em Matosinhos. O que achas?

- Acho bem, mas diz-me uma coisa: ainda não esqueceste a Mariana, pois não?

- Oh Eduardo, não digas isso nem a brincar. Eu amo aquela miúda! Por acaso vou-lhe ligar mal chegue a casa.

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